Eram mais de dez. Subiam lentamente com passos estudados a escadaria do Metro. Uns mascavam pastilha, outros ajeitavam os jeans deslavados que escorregavam nas ancas, e havia bonés e gorros e óculos de sol apesar do dia cinzento. Elas exibiam piercings e umbigos à mostra. Os cabelos eram louros, muito louros e compridos, e todas  vestiam leggings e t-shirts com brilhantes, com argolas, com cores, como se de repente, às sete e meia da manhã, essa fosse a farda oficial do dia. Aqui e ali os telemóveis acordavam com músicas da moda e entre "tás a ver" e "bués" chegou o Metro, e os palavrões subiram de tom, e ouve guinchos e risadas e palmadas nas costas e tropeções. Ficámos com uma garruagem de permeio, e eu voltei olhos e ouvidos para o "Eat and Dust" que me acompanha.
Na paragem seguinte o corropio e os guinchos trouxeram-me de volta. "Por aqui s'tora"... "estamos aqui, s'tora, aqui!" Aos pulos e tropelões invadiram a carruagem e rodearam uma figura miúda vestida de cinzento que distribuia sorrisos e ia perguntando "...então e a Núria não veio?...ó Caio que lindo penteado e tu Cátia, não terás frio só com essa t-shirt?"
E de repente senti um nó na garganta, e o coração amoleceu em lágrimas, e as páginas do livro encheram-se de memórias, porque aqueles miúdos, aqueles garotos do subúrbio, disfarçados de  gente grande, de repente não eram mais do que os meninos pequenos que viam nos olhos da sua professora aquilo que um dia poderiam ser. Porque ao contrário de mim, a figura miúda vestida de cinzento que distribuia sorrisos, acreditava que é possível um mundo melhor. E eu... eu tive vergonha de mim.



Comentários

Mensagens populares